Essa foi uma das principais conclusões da segunda edição da Jornada do Sommelier, promovida pela ABS-RS na Serra Gaúcha
A Somellerie terá papel fundamental com o avanço do consumo de vinho no Brasil. Essa foi uma das principais conclusões da segunda edição da Jornada do Sommelier, promovida pelo capítulo gaúcho da Associação Brasileira de Sommeliers (ABS-RS) no sábado, dia 4 de junho. O evento híbrido – que contou com a presença de aproximadamente 180 participantes no Spa do Vinho, empreendimento encravado no Vale dos Vinhedos, em Bento Gonçalves – foi transmitido no canal do YouTube da entidade para brindar o dia do profissional responsável pelo serviço do vinho, comemorado na sexta (3), e também o dia do vinho brasileiro, festejado no domingo (5).
Coube a Renato Neves, melhor sommelier do Brasil 2021, falar da profissão, do mercado e oportunidades. Ele iniciou sua apresentação fazendo um apanhado histórico da ocupação que, em abril, foi reconhecida oficialmente pelo Ministério do Trabalho e Previdência. Também falou da evolução da gastronomia, que iniciou pela cozinha clássica, passando pela brasileira até o estilo contemporâneo de hoje. O aumento do número de importadoras, o surgimento do e-commerce e clubes de vinhos também ajudaram a desenvolver o setor e a profissão. “O Brasil tem um diferencial em relação a outros países, pois oferece em suas cartas de vinhos uma diversidade enorme de rótulos”, destacou. Na visão de Neves, que é sommelier profissional pela ABS-Rio e que atualmente trabalha no Casa Camolese na capital carioca, o sommelier atualmente é um valioso gestor. Entre as principais habilidades devem estar a interação com os fornecedores, a sensibilidade para compreender as preferências dos clientes e a visão comercial. “Planejamento e capacidade para executar são ferramentas úteis para a profissão. É preciso estudar matérias relacionadas com gestão, saber comprar, vender e calcular as margens de lucro”, ensinou.
Deisi da Costa, a melhor sommelière do Rio Grande do Sul em 2021 e Babiana Mugnol, sommelière e jornalista do Grupo RBS, participaram do debate juntamente com Neves. A mediação foi feita por Júlio César Kunz, presidente da ABS-RS. Babiana, também formada pela ABS-RS, revelou que conquistar o diploma, que tem a chancela da Association de la Sommellerie Internationale (ASI), ajudou a cobrir o setor vitivinícola com mais profundidade. “Ser sommelière deu amplitude para a profissão de comunicadora, pois antes sentia dificuldade de conhecer a ponta do processo final da produção de vinho. Agora entendendo melhor aquilo que está na garrafa, conto melhor a história de personagens do cenário vinícola regional, especialmente dos produtores”, confidenciou. Deisi destacou que a tecnologia e a mudança comportamental das pessoas forjaram novos sommeliers com uma diversidade de habilidades, sendo que a principal delas é saber ensinar sobre vinhos.
“Você aprende dez vezes mais quando compartilha seu conhecimento”, sublinhou. Ela também fez questão de destacar a representatividade do vinho nacional entre os brasileiros. “Quer queira ou não, quem habilitou o paladar do Brasil no passado foram as importadoras. Hoje é o próprio vinho brasileiro”, comemorou. Deisi participou remotamente de Uberaba (MG), uma das cidades visitadas por ela na expedição Vou de Vinho, ação que resultará no lançamento de um livro contando como a história do vinho verde-e-amarelo se entrelaça com a geografia e história do país. Neves parabenizou a iniciativa de Deisi recordando que os donos de restaurantes deveriam incentivar que sommeliers visitassem zonas de produção em todo o Brasil. “Isso é fundamental para a viabilidade do negócio, pois o sommelier vende centenas de garrafas por dia. Se cobra o mesmo de um chefe de cozinha, ou seja, que tenha conhecimento mundial sobre gastronomia, mas também não há incentivo”, cobrou.
Somellerie em debate
A palestra “Futuro do vinho no Brasil”, apresentada por Suzana Barelli, jornalista especializada do jornal O Estado de São Paulo e pelo pesquisador Rogério Dardeau, mostrou dados sobre a evolução do consumo da bebida no país e também as novas regiões vitivinícolas. Nas últimas duas décadas, o Brasil viu a produção saltar 21,3% para 330,6 milhões de litros. Neste ano, o volume total, incluindo importados, deve chegar ao redor de 500 milhões de litros. O cenário é ainda mais animador quando a projeção feita pela Ideal Consulting prevê que o consumo per capita de 2,7 litros chegará até 3,3 litros em 2026. “O consumido brasileiro é bem menos preconceituoso com o vinho nacional. Porém, ele tem de tratar o vinho produzido aqui como vinho simplesmente. O concorrente da bebida não é ela própria, mas sim a vodca, a Coca-Cola”, afirmou Suzana. Na visão dela, o consumo de vinho continuará em ascensão, com destaque para os espumantes, e o mercado receberá novos consumidores.
Dardeau fez um passeio ao Brasil vitivinícola ao mostrar, além das regiões mais conhecidas, também aquelas que estão iniciando produção de viníferas. O trabalho é fruto do livro “Gente, Lugares e Vinhos do Brasil” que ganhará sua segunda edição atualizada e revisada em dezembro deste ano. Entre as novas localidades estão cidades como Colombo, no Paraná, ou mesmo Chapada dos Guimarães, no Mato Grosso. Graças à extensão geográfica do país, o Brasil consegue trabalhar com colheitas de verão e inverno, como acontece, por exemplo, na Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais. “Uma das belezas do vinho é a diversidade que podemos ter acesso, como os rótulos feitos pelos produtores artesanais”, destacou. Para ele, os principais desafios estão a formação de consumidores e profissionais de serviço. “Temos de seguir exemplos de Portugal e Chile que, ao promoverem suas regiões, abrem garrafas par os consumidores e sommeliers”, sugeriu. a logística, a comercialização e, principalmente, a atualização constante das estatísticas sobre o setor, são outras barreiras. “Hoje não temos dados, temos esforços [para isso]. Faz falta ao Brasil uma instituição que congregue informações sobre toda a cadeia. Estamos avançando, claro, mas se não tivermos esse trabalho mais ágil, avançaremos mais lentamente”, alertou.
A mesa redonda que debateu o passado, presente e futuro do mercado de vinhos teve as presenças de Angélica Brandalise, gestora de projetos da cadeia de vitivinicultura do Sebrae RS; Elisa Walker, responsável pela área comercial internacional na Wine South America; Felipe Guarnieri, sommelier do Spa do Vinho e sócio fundador do projeto de vinificação Vini Dell’Eternità; Júlio D'Agostini, diretor da Boccati; e Gontijo Jordan Pinto, diretor comercial da Moët Hennessy do Brasil. A moderação foi conduzida por Andreia Gentilini Milan, diretora da ABS-RS.
Gontijo reconhece que será fundamental para o crescimento orgânico do mercado vinícola brasileiro a criação de hábitos, principalmente fazendo com que não haja cobrança de regras para o consumo. “É preciso dar mais tranquilidade ao consumidor, porém sem abrir mão do conhecimento. Será fundamental saber contar histórias”, declarou. Nessa mesma linha, o sommelier terá de ter respeito ao paladar dos clientes em nome de um hábito menos formal de consumo - e para isso será preciso adaptar o serviço como também o portfólio de produtos de lojas especializadas. “Devemos estar prontos para esses novos consumidores que poderão pedir, por exemplo, gelo na taça de espumante. Levemos em conta que a temperatura média anual no Brasil é de 25 graus”, reforçou. A migração para plataformas online e redes sociais também será um divisor de águas para o setor como um todo. Hoje, as grandes varejistas nacionais comercializam 19% de todo o vinho no Brasil, mas o comércio digital sozinho já representa 13% desse total.
Com nove sommeliers contratados, o hotel os vê como alavancadores do produto local, porém sempre respeitando a escolha do cliente. “Quando se fortalece o mercado local, todos ganham. A lógica aqui é indicar primeiro o vinho do vizinho”, destacou Deborah. Como uma forma de colocar o vinho nacional em destaque, o estabelecimento tem como estratégia ter margem de 30%, índice bem abaixo da média dos restaurantes brasileiros. Ofertar experiências com a bebida rende importantes dividendos, como as boas-vindas aos hóspedes que são recepcionados com uma taça de espumante gaúcho. O investimento, de janeiro a maio, em ações como essa, foi de R$ 58 mil, o que resultou na venda nos cinco restaurantes do hotel, no mesmo período, de quase R$ 1 milhão em vinhos.
“O que nos une é o amor pelo vinho. E o papel do sommelier é unir pessoas. Ajudamos a escolher vinhos e a unir produtores e consumidores. Entendemos aquilo que pessoas mais gostam e damos feedback aos enólogos. Nosso papel preponderante é unir. E a ABS-RS une pessoas e instituições. Fazemos isso através do conhecimento e a segunda edição da Jornada do Sommelier pode oferecer ao público presente e a quem nos acompanhava remotamente muito conteúdo sobre a atualidade da profissão e, principalmente, seus desafios para o futuro”, evidencia Júlio César Kunz, presidente da ABS-RS.
O público presente pode participar da degustação de vinhos especiais de 11 vinícolas, lojas e importadoras acompanhados por harmonizações com a curadoria do Spa do Vinho e do chefe Fábio Lima. Uma feira de vinhos também fez parte da programação. A Agência Bem Vino, Ales Victoria, Amitié, Boccati, Cooperativa Vinícola Aurora, Cooperativa Vinícola Nova Aliança, Miolo Wine Group, Petronius, Vinícola Giaretta e Vinícola Tenuta Foppa & Ambrosi foram os expositores da feira.
A 2ª edição da Jornada do Sommelier contou com o apoio da Adega Refinaria, Amitié, Agência Bem Vino, Boccati, Chandon, Cooperativa Vinícola Aurora, Cooperativa Vinícola Garibaldi, Cooperativa Vinícola Nova Aliança, Dall´Onder Hotéis, La Charbonnade Château du Vin, Miolo Wine Group, Moët Hennessy Brasil, Petronius, Revista Prazeres da Mesa, Sebrae, Sicredi, Spa do Vinho Condomínio Vitivinícola, Trust Escola de Inglês, Vinhos e Vinhos.com e Wine South America.
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